segunda-feira, 10 de junho de 2013



A maioridade de Hierania não faz cessar sua dependência econômica


Minha filha, Hierania Batista Avelino Peito, nasceu no Hospital Felício Rocho, em Belo Horizonte/MG, em 9 de junho de 1.970.

Tão logo nascera, Geralda e gracinha notaram que havia algo de errado nos olhos dela.  Mas tinham receio em dizer que a filha do juiz de direito era cega.

Geralda era minha irmã.  Hoje, já, é falecida.

Gracinha era a babá de Hierania.

Dessa forma, apenas após surpreendê-las cochichando ao lado do berço de Hierania, passei a ter certeza que minha filha não enxergava.

Hierania foi a minha primeira filha nascida viva.  Tinha sofrido um aborto espontâneo antes de sua gravidez.

Por este motivo, não tinha muita experiência em cuidar de crianças recém-nascidas.

Mas chamava-me a atenção o fato de que Hierania gritava de dor todas as vezes que eu tentava abrir os seus olhinhos.  Pensava que isto iria passar com o tempo.  Mas o tempo passava e a reação dela era sempre a mesma.

Procuramos, Secundo e eu, vários oftalmologistas da cidade, os melhores que podíamos encontrar.

O Drº. Hilton Rocha, após examiná-la, disse-nos que seria possível que ela passasse a enxergar, desde que fosse submetida a cirurgia de catarata.  Diagnosticou que tinha, catarata congênita.

E assim foi feito.  Após duas cirurgias em cada um dos olhos, passou a enxergar do olho esquerdo.  Até que aos doze anos de idade, perdera a acuidade visual.  Tinha adquirido glaucoma.

Em 1º de fevereiro de 1.984, o Drº. Homero Gusmão de Almeida a operou de glaucoma no Instituto Hilton Rocha, em Belo Horizonte/MG.

O ano de 1.984 foi um ano verdadeiramente muito difícil para a nossa família.

Além de Hierania ter perdido a visão sensorial e de não poder ter ido a escola em razão do período que tivera que ficar em repouso após a cirurgia de glaucoma, atravessamos novamente outro período de carência econômica absoluta.  O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG) tinha deixado de me pagar a pensão alimentícia que recebia como desquitada de meu marido e não tinha passado a me pagar a pensão de viúva como manda a lei: 6.515, de 26 de dezembro de 1.977 (Lei do divórcio), em seu § 2º, do art. 2º.  Este dispositivo legal diz que o vínculo matrimonial só termina com a morte ou com o divórcio.  Assim, como Secundo e eu não éramos divorciados, o vínculo conjugal somente se extinguiu com a morte dele, o cônjuge varão.

Também, Secundo, Ismar e Geralda tinham falecido, respectivamente, em janeiro, abril e novembro daquele ano.

Fomos, ainda, vítimas de outras vicissitudes de grande complexidade para as nossas vidas.

Depois de receber alta médica e de percebermos a pensão que o TJMG tinha mandado pagar a Hierania, voltamos para São Paulo/SP.  Hierania retomou os seus estudos regulares no ano seguinte.  Foi estudar na Escola Caetano de Campos da Aclimação e, mais tarde, no Colégio São José da Rua da Glória.

A reabilitação ficou a cargo dos brilhantes profissionais, Walter, Ana Cristina, Maria Felipe, Maria Regina, Vilcéia, D. Tereza, Waldemar e Gal, todos, da Fundação para o livro do cego no Brasil, hoje, Fundação Dorina Nowill para cegos.

No início de agosto de 1.990, Hierania recebeu uma telefonema da diretora da magistratura, Drª. Rosana de Montealverne Netto, orientando-a a procurar um advogado para providenciar imediatamente uma Ação Cautelar de Justificação de dependência econômica no juízo paulista para evitar a suspensão de sua pensão e a conseqüente privação econômica severa que poder-se-ía avizinhar.

A Drª. Rosana de Montealverne Netto disse-nos que já havia sondado o president do tribunal, desembargador José Fernandes Filho, e este havia lhe dito que não iria pagar a pensão a Hierania, de forma alguma, quando ela completasse a sua maioridade.

A Drª. Rosana disse a Hierania que ele estava irredutível em sua posição e que fazia questão de ignorar, até mesmo, que, por ser estudante, teria o direito de perceber a pensão até os 24 anos de idade.

Em suma, o desembargador José Fernandes Filho não queria respeitar a lei e fazê-la cumprir em todo o Estado de Minas Gerais e, por conseqüente, no País.

A Drª. Rosana de Montealverne Netto estava preocupadíssima com o futuro de minha filha, Hierania.  Não queria vê-la sofrer.  Queria evitar privações materiais, dores, sofrimentos e angústias para ela.

Esta ação de justificcação econômica fora inicialmente instaurada no juízo paulistano, mas o juiz de Direito declinou de sua competência, enviando-a para a comarca de belo Horizonte/MG, a qual regressou a São Paulo/SP, por ser o foro do domicílio da Autora.

Serviram de testemunhas neste processo judicial, a diretora e a coordenadora do Colégio São José, a pedagoga que a assistiu neste colégio e o médico oftalmologista que acompanhava o seu tratamento de saúde visual na Fundação para o livro do cego no Brasil, respectivamente, Irmã Geny Eiras, D. Valéria César Pedroso, Drª. Mônica Regina Augusto e Drº. Alexandre Azevedo.

Durante a audiência, o juiz de Direito da vara de precatórios do Foro João Mendes Júnior, Drº. Messias, solicitou à Irmã Geny Eiras a transferência de sua esposa do Colégio São José de Santos para o de São Paulo na Rua da Glória.  E, como a Irmã Geny Eiras recusou-se em demitir uma de suas mestras do curso primário para dar lugar a esposa do mencionado juiz, este também recusou-se em proferir a sentença mandando pagar a pensão a minha filha Hierania.

O Drº. Messias cometeu o explícito crime de exploração de prestígio, em pleno exercício do cargo, prejudicando imensamente a vida de minha filha Hierania.

_E o que aconteceu com ele?

_Foi exemplarmente punido administrativamente pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP)?

_Ou mesmo, chegou a ser punido pelo sistema de persecução criminal do Estado brasileiro?

Não sabemos o que aconteceu com ele.

Sabemos, porém, que Hierania Batista Avelino Peito teve os seus direitos fundamentais barbaramente sacrificados, em sua juventude, pela irresponsabilidade de bandidos togados.

Em 9 de junho de 1.991, o desembargador José Fernandes Filho, desrespeitando a lei civil do País e os direitos fundamentais universais de Hierania, mandou suspender o pagamento da pensão que percebia pela folha de pagamento do TJMG.  Fez questão de ignorar também, todos os argumentos jurídicos e provas existentes no processo administrativo: 1116/9, de agosto de 1.990.

Hierania apenas voltou a perceber esta pensão na qualidade de sua titular, em 8 de outubro de 1.998, por meio da determinação de um ato administrativo do desembargador Lúcio Urbano da Silva Martins, então, presidente do TJMG.

Isto depois de uma grande e árdua luta civil e política para ver os seus direitos respeitados neste País.





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